# 10

Assim o farei, não se preocupe.
O amigo  não é o único com novidades, eu também as conto. Viajei recentemente para o Algarve para que pudesse me dedicar as crónicas, pude passear e apreciar tamanha beleza e o crescente turismo desde Vila Real de Santo António até a Ponta de Sagres, e devo dizer que muitos dos costumes e das mentalidades são alterados pelo turismo europeu nessas zonas...
É triste ver por vezes, porque devíamos nos orgulhar de sermos como somos e devíamos mostrar isso aos europeus, porque nós mudamos, mas eles não mudam por nós.
Abraço meu camarada.

Manuel da Fonseca

# 9

Deixe lá os outros, porque se tiverem que ser escritores serão.
Lembra-se quando a dias lhe disse que me tinha aventurado por novas terras na literatura dando protagonismo e metendo a politica em segundo plano? Então não é que consegui mesmo tirar algo disso? Pois bem, já o consideram a minha obra-prima, dei-lhe o nome de "Barranco de Cegos", é, de certa forma, uma biografia de Diogo Relvas (personagem) e passa-se a partir de 1891, altura da revolta no Porto e da crise financeira em Portugal. 
Peço lhe, que se tiver tempo lhe dê uma passagem e me diga o que acha.

Alves Redol

# 8

Concordo, de facto, é algo que se adquire, porque para ter um bom enredo do romance é necessário saber o que sentir.
Eu também não sou homem de uma só paixão, mas optei  pela poesia e sou capaz de ainda tentar a crónica, quem sabe, poderá sair daqui alguma coisa. Acredito que hoje em dia muita gente tente ser escritor, mas será que têm o que é preciso? Não digo que eu o tenha, mas não é só pegar numa caneta e ter estudado línguas que devemos ser considerados escritores.
Talvez partilhe a minha opinião talvez não, mas há que nos fazer ouvir.

Manuel da Fonseca

# 7

Sem dúvida que concordo consigo camarada, mas eu nunca fui homem de uma paixão só. A minha paixão são mesmo os romances, mas gosto de diversificar mostrando a minha escrita em outras áreas como no teatro, escrevi algumas peças entre elas "Maria Emilia", mas também me aventurei na literatura infantil iniciando-me com "A Vida Mágica da Sementinha". Talvez um dia pudesse dar hipótese a este tipo de escrita, ver um sorriso na cara de uma criança é muito compensador.
No outro dia fizeram-me uma pergunta que me deixou um tanto ou quanto as voltas na cabeça. Perguntaram-me o que deve um jovem fazer para chegar a romancista, eu fiquei sem resposta de inicio, mas depois de pensar acho que a resposta foi perfeita, para se ser romancista há que viver, a nossa vida tem que dar umas reviravoltas, conhecer muitos amores e sofrimentos, sonhos e frustrações, romancista não é algo que se aprenda por ler livros, mas sim por sofrer e triunfar na vida e aprendar a dar valor as pequenas horas de prazer.
E então camarada? Foi uma resposta boa não foi?

Alves Redol

# 6

Já a minha mãe me dizia, "devagar se vai ao longe", e é assim que temos de pensar.
Eu dei por mim a pensar que os contos são, de longe, o mais interessante a escrever, porque não temos que arranjar apenas um enredo, podemos exprimir todas as ideias que existem dentro da nossa cabeça (acredite que são muitas), dando assim uma diversidade as nossas histórias... Sem dúvida que o tema é sempre o povo, mas pouco antes de publicar o romance que lhe falei na minha última carta, publiquei um pequeno livro, "Aldeia Nova" com alguns contos por familiares vividos ou simplesmente contados, nem todos, pois há que juntar um pouco de imaginação por vezes.
Que me diz?

Manuel da Fonseca

# 5

Ficaria certamente feliz por ter tal oportunidade.
Oh, tem dias, tem dias. Umas vezes é como se as palavras deslizassem da caneta, mas noutras parece que não se querem soltar.
Ultimamente tenho sentido que a importância que dou a politica fazendo dos meus livros um modo de intervenção para tais aspectos não deveria ser tanta, ou pelo menos não deveria estar no primeiro plano... Portanto comecei a escrever um livro em que apenas me dedico as personagens e a sua evolução psicológica, não sei se sairá daqui uma obra prima, mas com o tempo a perfeição chegará um dia.

Alves Redol

# 4

Por vezes tenho o mesmo receio, que poucos, se não mesmo nenhuns se lembrem do que por nós foi feito.
Mas não nos preocupemos com o futuro que ainda vai longe. Como deve saber estou escrevendo um romance, decidi, dar de alguma forma protagonismo a minha cidade e aos mais pequenos, para mostrar que o povo também  importa. Pensei em lhe dar o nome de "Cerromaior", devido ao cerro de Santiago do Cacém ser o mais alto. Não sei se está interessado em saber mais um pouco da trama, mas pode ser que um dia lhe mostre os meus rascunhos.
Então e as suas obras? De vento em popa espero eu.

Manuel da Fonseca

# 3

É bom saber que não sou esquecido da sua parte. Aprecio isso, acho que há poucos como nós, para mostrar ao mundo o que os oprimidos não dizem, você os alentejanos, eu os pobres coitados que se escondem do regime em que vivemos... Mas será que mais tarde todo o  nosso esforço será reconhecido? É isso que me preocupa, que ninguém vá ligar.
Espero noticias suas.

Alves Redol

# 2

Camarada,

Comigo as coisas vão bem, dentro do possível. Depois de tanto tempo a estudar em Lisboa, decidi vir visitar o meu querido Alentejo, mas por um lado gostaria de não ter, pois estando aqui vejo a vida dura que muitos deste povo leva, se um dia puder irei retrata-la talvez pintada, talvez escrita, não sei bem ainda...
Vá dando noticias, nunca se esqueça.

Manuel da Fonseca

# 1

Caro Amigo,

Hoje dei por mim com necessidade de lhe escrever, não sei bem a razão, talvez para desabafar um pouco o fardo que é a vida. Como deve saber, toda a minha vida não tive grandes posses e sempre achei que defender os outros estaria certo, portanto juntei a minha paixão por escrita a vontade expor a luta das pessoas, foi quando surgiu o meu primeiro romance "Gaibéus", dando inicio ao neo realismo na literatura, ao que parece, uma literatura de cunho politico que se opõe aos regimes totalitários. Sim, a minha escrita é isso mesmo...
Mas com tudo isto nem lhe perguntei, como tem passado caro Manuel?

Alves Redol